O Homem do Chapéu

 

O homem do chapéu

Foi com grande surpresa que recebi aquela ligação me informando que havia herdado um imóvel, após a morte de um tio de quem eu sequer me lembrava.

Desempregado, seria uma excelente oportunidade de fazer um bom dinheiro. Então imediatamente arrumei as malas e fiz a viagem de cinco horas até a cidade onde o imóvel ficava.

Estava entardecendo e ao chegar no endereço informado os vizinhos me olharam com estranheza, sem que eu entendesse o motivo.

Apesar da estranha recepção tentei ser cordial e interagir com aquelas pessoas, na sua grande maioria já de idade um pouco avançada.

Me apresentei e expliquei o que fazia ali, mas pareceram não se importar muito com o que eu dizia.

Sobre meu finado tio falaram muito pouco, apenas disseram que ele era uma pessoa bastante reservada, de poucos amigos e um tanto misterioso.

Segundo eles aquela antiga casa estava abandonada há um bom tempo, diziam que era assombrada, que espíritos malignos vagavam pelos seus corredores e quartos vazios e empoeirados.

Eu nunca acreditei nessas histórias. Era um cético, sempre procurando explicações lógicas para as coisas e, na minha opinião, aquelas eram histórias criadas para depreciarem a casa, diminuindo o seu valor de mercado, ou apenas histórias de idosos desocupados e senis. Enfim, para mim aquilo tudo era baboseira.

Mesmo estando em ruínas estranhamente havia algo de fascinante nela, apesar das portas e do piso que rangiam. Era como se ela tivesse uma aura singular.

Pretendia passar a noite no local, economizando com hospedagem, para no dia seguinte providenciar o que era necessário para vende-la o quanto antes.

Comecei a explorar os inúmeros cômodos, procurando por objetos de valor ou lembranças da família, mas logo percebi que havia algo estranho quando notei que a única mobília na casa toda era uma cama desgastada em um dos quartos.

Achei aquilo sinistro, mas não me importei, para mim fantasmas eram coisas de pessoas obtusas, ignorantes, simplórias.

Não demorou muito e caiu a noite, foi quando comecei a entender do que a vizinhança falava.

Portas se abriam e fechavam sozinhas, às  vezes ouvia passos nos corredores, mas quando eu ia investigar, não havia ninguém. Deveria ser alguém da vizinhança me pregando uma peça, era a única explicação.

Fiquei puto, praguejei e gritei para assustar o possível invasor, e a situação se acalmou.

Eu estava certo, ou acreditei que estava.

Com uma lanterna perambulei mais um pouco pelo casarão até me dar conta de que não havia mais nada para encontrar ali e decidi ir dormir.

Ao me deitar na cama daquele quarto isolado tive a impressão  de ver uma figura sombria um um dos cantos. Tentei me convencer de que era apenas minha imaginação, mas, mesmo não acreditando em coisas sobrenaturais, eu sabia que não era.

A figura simplesmente desapareceu.

Enfim adormeci, mas no meio da madrugada fui acordado com um barulho. Me sentei na cama e olhei em volta, mas não havia nada. Foi quando ouvi uma voz. Uma voz baixa e rouca, que parecia vir de todos os lugares e de lugar nenhum ao mesmo tempo.

"Você atendeu ao meu chamado, você está aqui", ela disse.

Tentei gritar novamente, mas minha voz estava presa na garganta, tentei correr, mas minhas pernas estavam paralisadas.

A voz começou a rir, uma risada sádica e estrondosa que parecia vir de dentro da minha própria cabeça.

Senti uma presença no quarto, uma presença que parecia me envolver, sufocante e maligna.

Me sentei na cama e, ao olhar para o lado, foi que vi aquela figura aterrorizante, de pé, próxima à cama.

Não era possível identificar suas feições, era apenas um vulto alto e negro, usando um chapéu antigo e com dois olhos vermelhos como carvões em brasa.

Emudeci diante daquilo e a aparição lentamente levantou um dos braços, apontando para mim.

"Você vai vende-la, não é?", ela disse, com sua voz baixa e rouca.

Devo ter respondido afirmativamente com a cabeça, não me recordo.

"Pois faça isso, preciso me alimentar. Mas você tem uma escolha: você pode seguir em frente com o seu plano, aproveitar a oportunidade e esquecer essa noite ou pode continuar aqui e trazer almas para me conhecerem."

Novamente a gargalhada ecoou pelo quarto, me fazendo estremecer.

O brilho dos seus olhos ficou ainda mais intenso e então tudo escureceu, como se me golpeassem na cabeça.

Quando acordei eu estava deitado no chão, perto da porta, com a cabeça doendo. Confuso, me sentei e olhei em volta. A casa estava silenciosa, mas eu sabia que não estava sozinho. Era como se aqueles olhos rubros me observassem.

Sabia que eu tinha que sair daquele lugar, continuar com o meu plano de vende-la e seguir com a vida, mas eu não podia. Eu estava preso, preso por alguma força maligna que não me deixava ir.

Foi quando, então, ouvi a voz novamente. "Você nunca vai sair", ela disse. "Você vai ficar aqui para sempre, já fez sua escolha."

Só sei que estou aqui, na casa velha e abandonada, e que estou preso, preso por uma força que não entendo, e que nunca conseguirei sair desse lugar. Uma força que, até então, eu me negava a acreditar que existisse.

Mas você, que está lendo isso, caso receba um chamado para conhecer uma casa estranha, não vá! Não entre um um lugar assim, porque se fizer isso, servirá de alimento para o homem do chapéu.

Os vizinhos me avisaram, mas não quis acreditar, e estou pagando o preço.

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