O garçom é obrigado a usar avental e o grande desafio diário
consiste em mantê-lo limpo e livre das manchas de molho enquanto serve os
clientes. Trabalha num pequeno quiosque - "Jean Anthelme" gastronomia
- numa via lateral e pouco movimentada do shopping. Apesar do nome pomposo, o
estabelecimento não tinha nada de "haute cuisine" e na verdade
pertencia a um senegalês malandro.
Naquele dia ele divisou pela primeira vez a mulher que
ocuparia sua cabeça dali pra frente. Usava uma jaqueta chamativa e provocante,
tom vermelho-ketchup. Metida numa calça amarelo-mostarda, ela rebolou
graciosamente o traseiro por entre as mesas e cadeiras. A calça agarradíssima
delineava todas suas curvas, terminando num tênis cano alto também cor de ketchup,
mas um vermelho desbotado de ketchup diluído e de má qualidade.
-Posso ver o cardápio? - ela tinha aquela voz macia da moça
de previsão do tempo do rádio e a ruivosidade de seu cabelo lembrava Pepperoni.
O "cardápio" na verdade era uma única folha acartonada
plastificada, com as comidas na frente e as bebidas, brownies e muffins no
verso.
-Aqui também servimos lanches extra naturais pra quem quer
desintoxicar a glândula pineal. - ele repetiu as palavras que o senegalês
malandro lhe ensinara. Nunca soube o significado daquilo, assim como ninguém
nunca tinha questionado também.
Ela fez um "ok" retorcendo a boca exageradamente e
apertando os olhos, fixando-os num ponto no nariz dele. Estaria sujo? Não,
sabia que não, mas ela deteve o olhar ali por alguns segundos ainda. Então, na
dúvida, ele se esfregou com a mão enluvada. Ela girou impaciente o cardápio até
encontrar os lanches. Sua unha do indicador tinha a mesma cor do suco de goiaba
em polpa, e com essa unha ela apontou alguma coisa com muçarela de búfala para
comer. Sentou-se na mesa mais afastada dele. Tirou o fone da bolsa e ligou para
uma amiga, contente por ter sido aprovada numa entrevista de emprego ali mesmo
dentro do shopping.
E ele preparava o recheio do lanche, feliz por ela -
daquelas pequenas felicidades bobas e despretensiosas que a gente sente algumas
vezes durante o dia - quando escuta uma bronca:
-Ei, vai demorar muito? Qual seu problema? É só um lanche,
não é a santa Ceia!
A grosseria o enfureceu. Piorou ao escutá-la sussurrando ao
celular: "Ah, o cara aqui da lanchonete. Deve ter retardo mental, sei
lá."
Levou o lanche para montar perto do micro-ondas e, protegido
pelo quiosque, deu uma cusparada em cada pão. Também meteu o dedo dentro do
nariz e misturou a pasta esverdeada toda no recheio.
Ela sorria - ligando para outras amigas com a mesma alegria
- até o momento em que seu prato pousou na mesa. Ela fechou a cara e partiu pra
uma nova rodada de reclamações contra ele.
O pedido nem tinha demorado tanto assim mas ele nem quis
argumentar. Aquela coisa de o cliente sempre ter razão. O caralho que tinham!
Nesse meio tempo outras mulheres chegaram ao
estabelecimento. Uma delas tinha o cabelo com a textura e o brilho de um bicho
de pelúcia. Quando parou para anotar seus pedidos, ela lhe disse:
-Aquela moça... Ela não é pro seu bico, rapazinho.
Ele sorriu amarelo para a intrometida. Além de intrometida,
a mulher ia mudando de ideia várias vezes durante o pedido. Queria combinações
e ingredientes inexistentes no menu, ao ponto de irritar as próprias amigas,
cujos pedidos ele já tinha anotado.
"Um monte de mulher com a bunda quadrada de tanto
trabalhar sentada. Trabalham vendendo produtos caros que elas próprias não
consomem. Eu não, eu posso comprar um lanche desses que monto, mesmo o mais
caro deles." - pensava consigo, quando a mulher da jaqueta de ketchup lhe
acenou o cartão de débito. Ela pagou a conta e foi embora, deixando mais da
metade do lanche no prato.
***
-Vê se hoje capricha, hein?
Na segunda vez em que a atendeu, sua voz já não era mais tão
doce quanto na primeira. Seus cabelos não estavam mais tão acerejados e a
jaqueta espalhafatosa tinha sido trocada por um uniforme
preto-básico-vendedora-de-loja, com o preto da calça destoando do
não-tão-preto-assim blazer. Ele escondeu-se pelo quiosque, lambendo o pão
integral do lanche dela. Excitou-se demais com aquilo. Espremeu uma de suas
espinhas, uma bem reluzente, adicionando o resultado pastoso ao lanche.
-Mmmm, hoje foi mais rápido. Parabéns. - ela resmungou,
rude, enquanto mastigava.
Ele sorriu de volta, aquele sorriso que todo
cliente-que-tem-razão merece. Na próxima vez esfregaria os pães nas axilas. Ou
no saco?
***
Na décima sétima vez ele já tinha feito todas coisas
nojentas que podia imaginar antes de servi-la, e mesmo assim seus desejos não
diminuíam. Era tão excitante a ideia de estar, de alguma forma, dentro da boca
dela...
-Ainda tem daquela muçarela de leite de búfala? - ela
perguntou enquanto dedilhava distraidamente seu celular. Já não se sentava tão
distante quanto da primeira vez.
-Sim, mas vai demorar um pouco o preparo. Você pode esperar?
-Posso né, fazer o quê? Mas não tenho a tarde toda.
Aquela mulher mexia com ele de todas as maneiras possíveis.
A falsidade que mal disfarçava em suas conversas, a futilidade, a grosseria para
com ele... misturadas naquela expressão de puta blasé de capa de editorial de
moda. Devia ser tão gostosa quanto chata na cama. Ele nem precisou se
masturbar. Assim que baixou o zíper, um líquido deslavado já molhava sua cueca.
Esfregou-se na textura do pão rapidamente, amando e odiando aquela mulher
sentada a poucos metros dali, a adrenalina a mil. Encharcou os pães com seu
visco brancacento, quase sem conseguir controlar os tremores que sentia, uma
mistura absurda de tesão e raiva.
Ela reparou por um segundo nas pupilas dilatadas dele, antes
de mergulhar de novo no celular. Perguntou sem olhar:
-Você está bem? - foi a primeira vez que FALOU com ele como
uma pessoa, e não como "o garçom com retardo".
-Sim, espero que o lanche esteja de seu agrado.
-Hummmm delicioso! O que tem aqui?
Ele abriu a boca para gaguejar, a respiração acelerando
inversamente aos batimentos cardíacos, que diminuíam... como na tarde em que
sua mãe o flagrou se masturbando depois de adulto.
-Ah tá, já sei. É receita secreta, algo assim, né?
-É. S...sim, é isso mesmo! - sua voz escapou baixa e nervosa.
Fugiu da presença dela, para a parte de trás do balcão, para longe daquele
mundinho dela de comer e checar mensagens no celular. De lá esticava o pescoço,
arriscando um espiadinha, quando ela se descuidou deixando o molho escorrer
pelo queixo. Enlouqueceu com a visão dela resgatando o molho com o indicador,
devolvendo-o aos lábios. Imaginou-se gozando no rosto dela e depois brincando
com a consistência do esperma, passando os dedos por aqueles lábios. Ela
paralisaria o rosto com nojinho, a porra colando em sua pele, ela tentando
reclamar sem mexer muito a boca com medo de sentir o gosto...
Foi com muita força de vontade que conseguiu controlar a
ereção quando ela se aproximou para pagar a conta. Acompanhou cada passo da
musa com o olhar guloso e vidrado, até ela desaparecer por entre a multidão do
corredor lotado. Decidiu naquele instante, intoxicado de tesão e adrenalina,
que queria vê-la comendo um pedaço seu.
***
A praça de alimentação do shopping fechava uma hora depois
das outras lojas. Sempre reclamara daquilo, mas agora preferia assim. Tinha
medo de encontrá-la pelos corredores sem sua roupa de garçom. Sabia que ela não
o reconheceria. Pior: tinha certeza de que ela o ignoraria.
O último cliente daquela noite foi um homem de bigode que
apareceu pedindo "um lanche normal sem viadagens". Enquanto preparava
o lanche mais simples do cardápio, o estranho abriu sua sacola de compras e
tirou um binóculo dela.
-Trabalha muita mulher gostosa nesse lugar, hein chapa? Cada
delicinha... até tarde. Tem uma sardentinha ruiva a dois corredores daqui,
coisa de louco.
Ele meneou a cabeça, concordando. Muitas mulheres bonitas
mesmo. Devia ser a região. - falava coisas assim enquanto afastava o binóculo
do cliente, abrindo espaço na mesa para colocar o prato e o suco de laranja
"sem açúcar, putaqueopariu!".
-Quer ouvir uma piada, parceiro? - o estranho perguntou,
lambendo a maionese dos lábios. Sem esperar resposta contou a de um velhinho
meio surdo que estava no médico. O geriatra disse que precisava de amostras de
urina, fezes e esperma. O velhinho não ouviu direto.
-Aí a velha olhou pro marido e disse bem alto: Ô véio, ele
quer sua cueca! - ele terminou, gargalhando bem mais do que a piada valia. Já
devia ter contado aquela muitas vezes, e mesmo assim ainda ria no final.
Farelos de pão saltaram de seu bigode.
-Hahahahaha, cueca! - o garçom repetiu, mais para indicar ao
estranho que tinha entendido a piada do que achando graça.
-Sabe o que é a vida, parceiro? - o cliente perguntou após
terminar o lanche - A vida é você ficar olhando pra uma gostosa e de repente
perceber uma SUPER gostosa te olhando mas já te odiando pois você estava
olhando pra outra gostosa lá.
-É verdade. - limitou-se a concordar com aquela profunda
filosofia. Soltou uma risadinha pra acompanhar.
-Tá rindo do quê? - o estranho perguntou trincando os
dentes, tomando o cartão da mão dele após a máquina processar o débito - Põe
uma dentadura no rabo e sorri pro caralho.
"A última grosseria do dia" pensou, de certa forma
agradecido. O estranho já ia longe ao corredor.
Mais tarde, quando o shopping enfim fechou, ele correu
ansioso para chegar logo em casa. Ainda estava apaixonado pela ideia de cortar
a própria carne. Correu tão alucinadamente pelo estacionamento que nem percebeu
o carro escuro na rua lateral lá fora. Nem o bigode e seu binóculo dentro dele.
***
Tinha escolhido uma fatia pequena da palma da mão. Mal
dormira, tamanha a excitação. Cortou-se, congelou o pedaço de si mesmo que
daria a sua musa, e fez o curativo que agora escondia sob a luva descartável.
Foram horas intermináveis até ela aparecer em seu horário de sempre: 13:35.
Podia acertar um relógio pela rotina dela.
-Boa tarde, prepara algo bem saboroso pra mim que você já
conhece meu gosto e...
Ela continuou falando, mas ele deixou de ouvir, de
acompanhar. Só lia nos lábios rosados e brilhantes dela a palavra SABOROSO
repetidas vezes em câmera lenta.
-Oi? Está aí?
-Ah, ah... sim, sim. Tenho uma carne especial que veio de
fora. Com molho barbecue, pode ser? - a palma da mão formigava e coçava por
baixo da luva.
Algum Deus antigo da fome deve ter entrado em ação ali,
naquele momento. Ela aceitou muito bem a sugestão. Ele virou-se para o grill
elétrico e depositou seu pedaço ali, como se fosse um pequeno altar
improvisado. Olhava sem expressão para a própria carne grelhando.
Fez uma mesura exagerada ao servi-la, minutos depois. Estava
se ofertando à ela que, alheia, levou-o aos lábios. Mordeu o pão, a alface,
picles, o tomate bem fresco e cheiroso e seus dentes enfim atravessaram a carne
macia, bem temperada, no ponto certo.
-Isso aqui está... mmmm... gostosinho. Divino! - virou o
prato para o lado oposto, escondendo a mordida. Depois ajeitou a mesa
cuidadosamente e tirou uma foto do lanche. Às vezes os clientes faziam aquilo,
e ele nunca entendia bem o porquê.
"Bom, ninguém deve fotografar lanches ruins, né?"
Ela não se dirigiu mais a ele. Devorou todo o lanche em
silêncio, entre mastigadas e risadinhas abafadas, olhando para o celular.
Parecia que a foto estava rendendo comentários. Apesar de estarem a apenas uma
mesa de distância do outro, ela nem percebia a presença dele.
Ele, além do comichão na mão, sentia-se vazio. Estava dentro
dela, completara o ritual. E agora? Que faria dali pra frente? Cortaria da
outra mão? Uma fatia maior, talvez?
***
O homem do bigode cofiava a barba, consultando o horário na
luz azulada do painel do carro: 22 horas. A ruiva apareceu na porta do shopping
4 minutos depois, o máximo de atraso que se permitia. Nunca falhava. Ele
acertara seu relógio pela rotina dela.
"Não são adoráveis essas mulheres modernas? Sempre
apressadas com seus saltos altos. Absortas, checando celular e ao mesmo tempo
equilibrando a bolsa no outro braço." - pensava, enquanto descia do carro.
Quando dobrou o braço para trancar a porta, sentiu a umidade - nervosismo
líquido - do suor na manga da camiseta na parte interna dos cotovelos. Girou os
calcanhares, agora não tinha mais volta: caminharia até a curva deserta onde
cruzaria com ela.
Esteve ali dezessete vezes no último mês, analisando. Numa
delas, uma quarta-feira, demorou 42 minutos para passar uma segunda pessoa por
aquele caminho. Era perfeito para o bote, para o ataque, para a... COISA.
Sim, grandes cidades tem esses "buracos" em sua
estrutura. Locais quase invisíveis às pessoas tão ocupadas com suas vidas, com
suas contas a pagar. Sistinas era plena deles, desses "vazios".
Aquela curva deserta era um desses portais, onde o inferno tocava os humanos,
onde demônios dançavam, se divertiam... e abordavam suas vítimas.
No momento em que ela percebeu uma presença apressada e
levantou a cabeça do celular já era tarde demais. Quando o homem do bigode olha
para ela, ela SABE o que ele vai fazer. Descobre durante o perturbado contato
visual. Confusa entre largar as coisas ou não, ela perde segundos preciosos que
farão diferença no jogo da sobrevivência. Ainda assim começa a correr, o olhar
assustado e apalermado. O homem joga a mão para a frente, esticando até seus
dedos ansiosos e trêmulos encontrar algo. Não sabia se estava puxando os
cabelos vermelhos dela ou um cachecol, mas a moça se enrola na corrida, perde
um dos saltos e vira presa fácil. Ele abraça o pescoço dela, arfando ansioso. A
ruiva coloca as mãos entre os braços do homem e seu próprio pescoço, adiando o
aperto que a imobilizaria. Lembra de pisar nele mas, confusa, usa o pé que
perdera o salto. Ela só machuca o próprio calcanhar no homem que, rindo,
consegue enfim vencer a batalha, sufocando-a.
Sem mais apoio nem forças pra pisar, a mulher joga
desesperadamente os braços pra trás, tentando acertar a virilha do agressor.
Lembra de que não pode gritar "ajuda", pois isso só afasta as pessoas
que poderiam ajudá-la.
-Não-não-não-não-não-não-não-não-não! FOGO, FOGO!!
Aquilo só diverte mais o agressor, mas ela consegue acertar
o saco dele com bastante força. Ele dobra com a dor e perde a ereção, mas não a
solta inteiramente. Ela tenta se desvencilhar e quando vira de frente, ele a
empurra para o chão.
-Sua vaca filha da... - o homem cai logo por cima, apertando
a mão na boca da vítima, trancando seus gritos por socorro - Cabelo de fogo dos
infernos, vou te ensinar...
Os olhos dela se afogam em lágrimas desesperadas. Suas unhas
frenéticas riscam o ar, depois o antebraço dele. Tentam alcançar o rosto de
bigode, puxar seus cabelos. Por aquela audácia o homem resolve que cortará
todos os dedos dela após a diversão. Não quer que os policiais encontrem
resíduos de sua pele embaixo daquelas unhas bem pintadas.
Ele sente a primeira mordida na palma da mão, mas ainda é
uma dor aceitável. A puta mordia forte. Quebraria aqueles dentes um a um.
A segunda mordida é quase insuportável. Piranha. A terceira
rasga sua carne e o sangue jorra, morno.
Incrédulo, ele tenta se soltar da boca
que mastiga e mói seus músculos tenares. Seu polegar morre, acaba de perder os
movimentos dele pra sempre. É sua vez de gritar.
Ao longe aparece um casal e outro logo atrás deles. O homem
de bigode cai, ensanguentado. Está em choque e a mulher ainda mantém a mão dele
na boca, ainda desfia músculos entre os dentes raivosos. As quatro pessoas se
aproximam com aquela curiosidade mórbida e ao mesmo tempo covarde que move a
humanidade.
-Mas o que que...? - diz o primeiro rapaz, até perceber que
tudo aquilo é sangue. A namorada saca o celular pra filmar.
-Larga ele sua maluca! - grita o segundo casal. Um dos
seguranças do shopping aparece imediatamente, cassetete em punho. O mundo do
homem de bigode vai escurecendo conforme o brutamontes corre em sua direção,
até apagar por completo.
***
Quando abre os olhos novamente, o bigode está numa sala de
espera de hospital. Sozinho, largado numa cadeira de rodas, seu primeiro
impulso é procurar pela mão atacada, agora enfaixada. Ele tateia a bandagem
úmida e avermelhada e cutuca o dedão morto. À sua esquerda uma mulher
hiperbólica reclama de tudo. Da fila, do calor, da lentidão do atendimento. Da
própria pele ressecada. Do celular que não tem sinal para fazer ligações. Do
marido ciumento que vai pensar que ela tava com outro homem. O bigode gira a
cabeça pra direita, e um velho está reclamando que o pedreiro não está usando
as ferramentas certas na reforma de sua casa.
-Ei, ei cara, olha isso.
Antes que o bigode possa ignorar, o homem à sua frente se
curva, mostra-lhe algo na tela de seu celular e começa a ler:
-...22 anos, agrediu e estrangulou um cachorro após consumir
maconha sintética em Waco, Texas. Em seguida, ele mordeu o cão, arrancando
pedaços de carne...
-Puta merda cara, sai daqui! Nem acordei direito, que merda!
- Nesse momento uma enfermeira repara que ele está acordado em meio aquele mar
de pessoas rabugentas e vem buscá-lo para ser medicado outra vez.
-Não precisa me empurrar, estou bem. Tenho pernas. É só
minha mão que está machucada.
-Senhor, fique sentado por favor. Estamos cheios nessa noite
e parece que a cidade enlouqueceu. - ela se abaixa na direção dele, descendo o
volume da voz junto - Chegou uma mulher com pelos e fiapos de carne de cachorro
nos dentes. Ela atacou o próprio poodle de estimação. Mastigou, dilacerou o
bicho. Veio sedada pela polícia.
-Que merda é essa que você está me contando? - sua mão agora
formigava - E aquele cara do celular falando de gente mastigando cachorro...?
-Os vizinhos dizem que ela tinha esse cachorro há nove anos.
Senhor, por favor fique sentado senhor.
O homem de bigode grunhiu baixinho. Estava irritado e
querendo sair dali o mais rápido possível. E se a polícia aparecesse ali
querendo saber o que tinha acontecido? A enfermeira continua falando da porra
da mulher louca e seu poodle mastigado enquanto preparava um medicamento
intravenoso pra ele.
-Senhor, esse remédio pode dar uma leve coceira nos
genitais, ok?
Mais um grunhido como resposta. Quando ela colocou a mão no
ombro dele para tranquilizá-lo, ele a atacou e mordeu entre o polegar e o
indicador dela, o primeiro lugar onde seus dentes se encaixaram com firmeza. A
enfermeira gritou e ele percebeu que tinha cometido um grande erro. Saiu em
disparada pelos corredores, empurrando todas as pessoas em seu caminho. Devia
ser perto das três da manhã quando enfim alcançou a calçada e sentiu a brisa da
madrugada no rosto. Não parou de correr, nem olhou para trás.
***
Devia ser perto das sete horas quando a enfermeira chegou em
casa. Uma luz fraca emanava do seu quarto. Imaginou que seu namorado tivesse
esquecido a televisão ligada e estava dormindo, mas não. Estava bem acordado,
apoiado na cabeceira forrada de travesseiros. Tinha o notebook no colo, de onde
saíam gemidos bem falsos, bem ensaiados.
-Opa, alguém assistindo filme pornô na minha cama essa hora?
Qual o tema? Enfermeiras?
-Claro. Acordei excitado. Vem cá, vem ver comigo.
Ela não estava no clima, mas também não recusou a
provocação. Tirou o jaleco, abandonou os tênis brancos pelo caminho e afrouxou
a calça. Enfiou-se na cama e olhou para o filme que se desenrolava na tela. Uma
loira peituda e de lábios inchados inclinava-se por sobre seu paciente bem
dotado e o engolia com maestria, subindo e descendo com vagar e sensualidade.
-Porra, já te falei pra parar de ver essas merdas. Nenhuma
enfermeira usa salto alto nem essas viseiras ridículas com cruz vermelha. Nós
usamos calças confortáveis e tênis com solado silencioso. - ela falava e
mordiscava uma coceira no dedo indicador.
-Tudo bem, minha enfermeira. Eu também não tenho um pau tão
grande assim e nem aguento bombar meia-hora igual bate-estaca. É só fantasia,
relaxe. Aqui, ó... pega nele.
-Ah, desculpa amor, noite difícil... posso até assistir
junto pra dormir, mas não vai rolar...
-Ah amor, acordei cheio de tesão. Pega nele vai, bate uma
pra mim então.
Ela levantou a mão direita enfaixada, triunfante.
-Não vai dar, meu bem. Um maluco me mordeu durante o plantão,
acredita?
-Porra, não é possível! Me recuso a dormir com tesão, vou
acender seu fogo de um jeito ou de outro. - ele reclamou, bem humorado.
-Você sabe como me relaxar, amorzinho...
-Cala a boca e abre essas pernas, tô com sede.
Ela se ajeitou na cama, fechando o notebook na hora em que a
peituda oferecia uma espanhola bem ritmada ao paciente. Deixou ele puxar a
calça branca, todo desajeitado, apressado. A descida emperrou, como sempre, em
suas panturrilhas grossas.
-Calças confortáveis o caralho! - ele riu e se debruçou na
calcinha dela. Lambeu por cima do tecido mesmo e a luz fraca do começo da manhã
o ajudava a delinear as carnes macias que estavam ali embaixo. Puxou a última
peça ao mesmo tempo em que ela conseguia libertar a calça de uma das pernas. A
vagina abriu-se ao alcance dos lábios dele e o aroma forte feminino o convidou.
Começou lambendo de leve, separando os lábios com a língua enquanto ela
suspirava. Colheu daquele mel conforme ela ia molhando, e em pouco tempo
lambuzou-se todo. Para quebrar um pouco o ritmo ele lambia suas virilhas,
mordiscava suas coxas e subiu as mãos pra brincar naqueles peitos fartos que
ela tinha. Esperava pelo sinal - que no caso era quando ela segurava firme em
seus cabelos - para subir e penetrá-la. Seu pau já estava tão duro quanto
dolorido. Agora enterrava a língua nela e sorvia todo o caldo com vontade.
Quando beliscou os dois mamilos veio a resposta que esperava dela:
-Vem aqui foder gostosinho, vem. Quero dentro.
Ambos já eram entrosados demais no sexo. Ele se ergueu e ela
já enroscou o pé no calção dele para ajudá-lo a se despir. Esticou a perna e
depois se abriu ao máximo para recebê-lo. Ele adentrou, aliviado, naquela
quentura e umidade tão gostosa.
-Quero gozar dentro. - ele disse no ouvido dela.
-Pode. - ela gemeu, e se mexeu pra encaixá-lo melhor. Não
foi preciso muito esforço pra dar o que ele queria. Ela se sentia até um pouco
culpada por querer acabar rápido.
-Vou... gozar. - ele avisou minutos depois e a beijou ardorosamente,
enquanto se esvaziava dentro dela.
A enfermeira permaneceu de olhos fechados, sentindo o caldo
dele preenchê-la. Ele veio com uma, duas esguichadas e... uma terceira, mais
fraca. A língua dele tinha gosto de cerveja amanhecida misturada com o gosto de
sua feminilidade e dançava freneticamente em sua boca.
Ele agora lambia os dentes dela com paixão, num gemido
abafado. Ela chupou para si a língua dele, até doer. E então mordeu com toda a
força!
Biografia
Lewd - nasceu e vive em São Paulo/SP. Misterioso, filho da
internet por profissão e vampiro sexual por natureza, ele adotou o pseudônimo
“Lewd” e escreve sobre vampiros eróticos desde 2000 no site www.sistinas.com.br
Já participou de diversas coletâneas de ficção, terror e
fantasias urbanas ao lado de outros grandes escritores nacionais.
A semente desse conto remonta 2012, quando várias notícias bizarras de canibalismo se espalharam pelo mundo, num espaço muito curto de tempo.
ResponderExcluirComeçou em 29/05, quando um homem nu atacou um sem-teto embaixo de uma das pontes que dão acesso às praias de Miami, EUA. Foi morto a tiros pela polícia, após comer quase todo o rosto da vítima, incluindo olhos e nariz. Os agentes acreditam que o canibal agia sob efeito de drogas como LSD e cocaína.
O crime do homem que devorou o próprio cachorro, citado na cena do hospital, aconteceu no começo do mês de Junho.
Em 01/07, um estudante americano de engenharia elétrica comeu o coração e parte do cérebro de um ganês, ex-estudante do mesmo curso. As mãos e partes da cabeça da vítima foram encontradas em sua residência, e o o resto do corpo do africano foi deixado em uma lixeira perto de uma igreja da comunidade.
Em 02/07, um motorista bêbado teve um ataque de fúria e atacou o carro de uma mulher no trânsito em Wenzhou, China. Quando ela tentou fugir do veículo, ele a atacou, derrubou no asfalto e começou a comer o rosto dela. Só foi detido quando a polícia chegou ao local. A vítima teve que fazer cirurgia reparadora no nariz e lábios.
Em 10/08, na cidade de Foshan, China, um homem sem camisa cercou e atacou uma mulher, mastigando seu rosto. Quando a polícia chegou ao local, ele tentou fugir pulando na traseira de um caminhão em movimento. Antes disso tentou morder o braço de um dos agentes. Foi encaminhado para o hospital para diagnosticarem se tinha alguma doença mental.
Em 23/08, no Reino Unido, uma mulher arrancou com os dentes pedaços da mão de outra, ambas estavam numa casa noturna. A vítima ficou quase um mês no hospital. A agressora chegou a ser detida, pagou fiança e foi libertada. Logo depois atacou uma segunda vítima, que teve o dedão de uma das mãos mordido. Segundo o promotor, a agressora disse ter atacado porque estava com fome e ficou alterada.
Enfim, em 27/09, aqui no Brasil, na Baixada Fluminense, um adolescente de 16 anos arrancou um dos olhos da própria mãe, furou o outro e comeu partes do corpo dela. A mulher teve pedaços do rosto e do seio arrancados com os dentes e foi internada em estado grave. O jovem sofria distúrbios mentais.