Há cinco
anos que tenta de tudo, sempre em vão, como quem percebe suas olheiras vestidas
de evidências e pensa a respeito de seu coração sofrido e sua alma fragilizada.
Sua mente,
seu corpo e seu espírito estão severamente danificados pela sua realidade e tal
constatação o assola como febre.
Pois sabe
que nada mais o completa, como se seu sorriso houvesse sido guardado dentro de
uma gaveta empoeirada e esquecida.
Enquanto se
reconhece, como uma planta carente de água e pronta pra secar definitivamente.
E no momento
em que olha pro oitão, que comprara em um boteco de bandidos pela quantia de
200 paus — preço de banana —, evita tomá-lo em suas mãos, embora saiba que é
mais fácil encontrar uma bala em sua cabeça, que um pingo de sorte em sua vida.
É a dúvida.
O niilismo
que se estende há muitos e muitos dias.
O receio.
A
paralização que o toma.
Que o
sequestra.
E mesmo
tendo passado as últimas 12h com um litro de uísque e todo tipo de drogas sobre
a mesa da sala, como quem arma um ritual pra encontrar coragem e carimbar sua
despedida, ele não se sente confiante e por isso, hesita e engole um tanto de
angústia, que corre amarga garganta abaixo e assume um sentimento de impotência.
Ele tem
medo de tremelicar no momento de apertar o gatilho e não terminar com nada e
piorar a sua situação calamitosa.
“Como
farei?”, pensa.
Em meio a
tudo isso, a maldita voz, ressoa em sua cabeça, um vozear pesado, embargado,
ferino.
Ao momento em
que identifica o mesmo arrepio, que subira pela sua espinha e tocara sua nuca
naquela maldita tarde ensolarada e fria e que marca o ponto de virada em sua
vida.
Ao instante
em que se lembra dos olhos dela e sua face tranquila e pálida, que o enfrentara
pra maldizê-lo por conta de um encontro torto, que se tornara fatídico e acontecera
em um domingo à tarde.
Um dia como
qualquer outro, em que uma simples ida à padaria pra comprar um pacote de pão se
tornou um calvário por conta de uma escolha errada que mudara o seu futuro.
E que
deixara pra trás, uma época saudosa, em que tinha um amor em casa, em que tinha
um emprego, em que dormia. Em que raciocinava e em que sentia vontade de deixar
sua cama pra enfrentar o mundo, porque tinha certeza de que podia vencer tudo e
todos que o colocassem em xeque.
A vida era
boa.
Radiante.
Um tempo em
que se sentia forte e centrado.
E mesmo
assim, tudo desmoronara como uma pilha de cartas que imita uma pirâmide e que a
gente sopra pra derrubar enquanto distrai um sobrinho ainda de colo e que de
tudo acha graça.
Contudo,
entretanto, porém e todavia: ele a encontrara num canteiro de flores ao pé da
passarela e que a mantinha sitiada entre as plantas e os carros estacionados.
E quando a
mulher o chamou: “eu leio a sua sorte”, respondera: “vai à merda”.
Um grande
erro de sua parte, pois teve de ouvir as seguintes palavras profanadas pela
idosa: “a sua sorte acabou”.
As mesmas
palavras que nunca mais abandonaram a sua cabeça.
As mesmas
palavras que o transformaram em um desafortunado em todos os sentidos.
As mesmas
palavras que secaram sua vida e arrancaram-lhe tudo, como só uma boa praga pode
fazer.
E agora, não
passa de um fraco, um louco, um sem fome, um sem força, um sozinho e um sem
nada.
Pois tudo
que lhe resta: é a casa suja como um chiqueiro.
E uma vida
amarga como jiló.
Ao instante
em que sua ex-mulher ostenta uma vida refeita e rodeada de uma felicidade nua e
crua aos olhos de todos.
E o pior: fez
uma dívida imensa na biqueira, a qual ele sabe muito bem, que jamais poderá
pagar a não ser com o próprio pescoço.
Uma bola de
neve.
Um rolo
compressor.
Um novo
problema.
Mais um
tiro no pó.
E uma nova
encanação pra fazê-lo tremer ainda mais.
É um tanto
mais de peso, que ele mesmo colocara sobre seus ombros pra somar a todos os
demais, que o assolam implacavelmente.
E mesmo
diante do oitão carregado até a boca e uma palpitação maluca em seu peito,
ainda assim, lhe falta coragem pra depositar o cano dentro da própria boca e
apertar a porra do gatilho.
Triste
condição.
Louco de
tudo e de medo.
Consciente
de que até mesmo a sua coragem fora roubada pela maldita praga: “a sua sorte
acabou”, ao tempo em que se encontra preso a um futuro demolidor e que o matará
de uma maneira dolorosa e lenta em forma de uma vingança que o impede de tomar
uma atitude pra evitar todas as maldições que ainda estão por vir.
E talvez,
esta seja sua maior tortura, esperar pela desventura sem fim, de mãos atadas e
tremelicas, sem um pingo de esperança e sem qualquer chance de fuga, que possa
chegar, através de suas próprias mãos.
Bom texto!
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