Conto - Nós de Alimento.

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Nós de Alimento

 A médium Zanabia estava pronta. Aquela seria sua maior pesquisa sobre o estudos espirituais, mas isso não era o mais importante... O dinheiro, esse sim era. No fundo a única coisa que importava para ela era usar seu dom para publicar seus livros sobre o assunto e arrecadar dinheiro para agencia que contratava para promover seus experimentos mediúnicos.


Segundo alguns estudos a alma de uma pessoa (corpo físico em conjunto ao espirito) podiam ser descolados temporariamente durante um processo mediúnico, mas isso não era novidade, pois era um processo que qualquer pessoa poderia ter durante o sono magnetizado ou numa experiência de desdobramento.  O ineditismo daquela experiência visava deixar o espirito o mais longe possível do corpo físico e ver o que acontecia.

Três crianças foram escolhidas por serem comprovadamente suscetíveis aos efeitos da hipnose mediúnica. Eram dois meninos e uma menina na faixa dos doze anos.  Zanabia pediu que as crianças fossem mantidas em um quarto completamente fechado, e monitoradas por câmeras de segurança e microfones instalados pelo quarto.

A médium foi para uma sala onde poderia ver as crianças instaladas em camas através das câmeras e falar com elas através de microfones instalados no quarto. A experiência se iniciava...

***

Através dos microfones Zanabia entoava os comandos de relaxamento para preparar os fluidos energéticos delas. Para garantir que nada iria intererferir em sua experiência pediu que as crianças fossem levemente sedadas para que não houvesse interferência de medo ou ansiedade por parte delas. Após dez minutos do inicio do processo as crianças estavam em transe.

***

Primeiro Dia

Tudo estava bem nos primeiros três dias. As crianças ficavam deitadas sobre suas camas olhando para o nada, e pareciam responder a qualquer estimulo físico sem seus corpos. Pareciam bonecos de cera com uma pele pálida, quase como se o sangue não circulasse mais em suas veias. Seus olhos estavam abertos de forma perturbadora e nunca se fechavam, mas elas não reclamavam de fome ou desconforto .

Zanabia já podia sentir o cheiro da grana que receberia se tudo desse certo. Preveniu a seus auxiliares que manter o espirito longe do corpo por muito tempo como pretendia fazer poderia causar uma reação de deterioração física e mental a longo prazo, mas até momento as crianças pareciam bem.

Zanabia começou a tentar se comunicar espiritualmente com a alma das crianças que pareciam estar vagado por outro universo. Através de Zanabia, através da psicografia as crianças falavam sobre incidentes traumáticos em suas vidas passadas e o desejo de retornar a seus corpos.

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Segundo dia

Zanabia começou sentir esgotamento físico grande, pois as crianças tinham penetrado fundo demais no universo espiritual e isso exigia mais de sua energia mediúnica para manter a comunicação. As conversas ficavam mais sombrias. Elas falavam sobre demônios, sobre o desejo de morrer e de querer voltar para seus corpos. Relatavam sentir muita dor e medo e que estavam cercadas por alguma coisa que começa as perseguir.

Durante um dos relatos um dos meninos em transe começou a reagir no quarto fechado. Começou a gritar e se debater pedindo por ajuda dizendo eu seu corpo estava queimando. Zanabia interrompeu a comunicação e mesmo exausta pode ver pela tela a sua frente que mostrava as câmeras a cena.

Os auxiliares já se preparavam parar entrar no quarto, mas Zanabia os proibiu. Aquilo era algo inédito. O corpo estava reagindo mesmo separado da alma, estava respondendo a um estimulo que recebia de seu espirito. Nunca havia visto algo tão incrível.

- Senhora, ele parece estar sofrendo muito, temos que o retirar da hipnose – argumentou um auxiliar ao lado de Zanabia.

- Não, eu quero ver o que acontece... Quero ver mais...

O garoto começou a machucar o próprio corpo com as unhas e seus gritos começaram a ficar abafados pela falta de ar que parecia sentir. Era comos e algo o sufocasse.

- Ele vai morrer! – Disse um outro auxiliar na sala de monitoramento.

- Ele é jovem... Ele vai resistir mais um pouco. Quero ver mais... – Os olhos de médium brilhavam pensando o quanto aquilo poderia render a ela. Uma descoberta daquela a faria uma estrela em todos os programas de televisão e esfregaria na cara da ciência incrédula a existência de um mundo espiritual.

A médium sentiu uma tontura forte. Pediu a um auxiliar um papel e uma caneta. Ela estava recendo uma comunicação. “TRAGA- O DE VOLTA!!! TRAGA-O DE VOLTA” começou a escrever de forma febril no papel.

 O garoto parou de se debater e entrou em estado que parecia um sono profundo de forma.

- Meu Deus... Ele não esta morto? Está – começou a gritar uma auxiliar.

Zanabia sentiu como uma pancada forte em seu estomago e o contato com espirito foi cortado.

Três auxiliares abriram o quarto e constaram que o garoto estava morto, mas o mais assustador era que seu corpo estava coberto de cicatrizes que pareciam serem feitas com fogo e não apenas por suas unhas.

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Terceiro Dia

Zanabia teve que dar explicações a seus superiores sobre o ocorrido, mas os convenceu em continuar com experiência com as duas crianças. Ela sabia que havia conseguido entrar em algo que nenhum outro estudo espiritual havia chegado, mas ela podia ir mais fundo...

Mantidas ainda sobre sono hipnóticos as suas crianças começaram demonstrar uma personalidade animalesca severa. Elas não respondiam mais através da psicografia e sim falavam, mesmo estando sobre efeito da hipnose espiritual. Suas vozes eram fracas e tinham excessos de raiva sem explicação que as levava a auto-mutilação. Zanabia pediu para que fossem amarradas na cama. Sem explicação começavam a se debater e pedir que as libertássemos daquela dor. Falavam coisas desconexas.  

Mesmo sem comer ou dormir as crianças no geral ainda pareciam fisicamente bem, apenas mentalmente afetadas o que já era uma grande descoberta. De alguma forma sem o espirito ligado ao corpo a matéria se tornava alimentada por algum tipo de energia que conservava. A pergunta agora era por quanto tempo os corpos poderiam continuar naquele estado sem degradar.

Se menino que morreu Zanabia agora tinha apenas o casal. Quando tinha um ataque e começava a gritar o menino parecia reagir a isso, como se quisesse a proteger de algo. Zanabia tentou vários contatos mediúnicos com os espíritos das crianças, mas eles haviam entrado fundo demais no mundo espiritual para serem alcançadas. Se comunicar diretamente com eles se tornava impossível. Seus corpos físicos era apenas espelhos dos reflexos do que viviam do outro lado.

***

Quarto dia

A menina desenvolveu uma força incomum e se soltou das amarras da sua camas e começou a correr pelo quarto em aparente pânico.  Por questão de segurança Zanabia vetou acesso ao quarto a seus auxiliares.

A médium propôs a seus superiores interromper o transe e permitir que o espirito das crianças voltasse ao corpo. Seu pedido foi aceito por eles.  Zanabia não queria admitir mais começava ter medo daquilo que estava fazendo. Bem ou mal já tinha conseguido material suficiente para publicar mais livros de sucesso na área da parapsicologia.

***

Quinto Dia

Durante processo de retorno as não saíram do transe. A menina corria pelo quarto gritando e arranhando seus rostos e se recusando a ouvir os comandos da médium enquanto o garoto ainda preso em sua cama se debatia.

A médium ficou assustada ao perceber que as crianças conseguiram espiritualmente ir tão fundo que era impossível retornar. Haviam adentrado a outro mundo.

***

Sexto dia

 As câmeras pararam de funcionar todas de uma vez e Zanabia decidiu que precisavam abrir o quarto e lidar com aquela situação de alguma forma. Reuniu todos os seis auxiliares presentes e foi junto com eles para abrir a porta do quarto.

Ao abrir a porta do quarto um cheiro terrível de coisa morta entrou pelo nariz de Zanabia. As luzes não estavam acendendo, então a médium mediu lanternas ao auxiliares que foram buscar.

Assim que as lanternas chegaram, ela e seus seis auxiliares entraram no quarto. Não havia qualquer sinal das crianças dentro do quarto o que causou espanto em todos. Elas haviam sumido.

Zanabia adentrou mais para dentro do quarto e sentiu algo estranho sobre seus pés. Ela olhou para baixo e sentiu uma tontura forte que quase a derrubou, mas um auxiliar a segurou antes que caísse no chão.

- Isso é sangue? Mas como pode ser? – falou um auxiliar em choque.

- Eles não tem como ter saído daqui – falou outro auxiliar assustado

Uma voz que era tudo menos humana saiu da boca de Zanabia.

- Vocês não deveriam ter nos perturbado, agora nós queremos ficar aqui. Nós gostamos daqui. Gostamos desses corpo...

A porta do quarto do quarto se fechou sozinha fechando todos ali dentro. As lanternas se pagaram deixando todos no escuro. O cheiro de morte aumentou ainda mais.

O auxiliar que segurava Zanabia sentiu seu corpo todo estremecer enquanto continuava a falar com aquela voz demoníaca.

- Vocês não conseguem nós ver dentro dela? Claro, que não... Nós somos mais antigos e estávamos há muito tempo esperando... para nos alimentar  

- Por que vieram para cá? – perguntou auxiliar que segurava o corpo de Zanabia

- Não viemos... vocês nos trouxeram... Vocês nos deram alimento

- O que são vocês?

- Nós somos aquilo de que rastejam sobre vocês enquanto dormem nas suas camas a noite. Nós paralisamos seus corpos vazios e usamos enquanto não podem voltar.

- O que vocês querem?

- Alimento.

O auxiliar que segurava o corpo de Zanabia sentiu-a ficar completamente rígida, até algo o atingir com força nas costas o jogando no chão.

Zanabia saiu do estado de transe completamente exausta. Ela sentia seu corpo paralisado sendo coberto por algo quente e viscoso ao cair junto com auxiliar que segurava.  Ela podia ouvir seus auxiliares gritando no escuro, mas não conseguia se mover.

Ela sentia medo e queria correr e gritar, mas algo a prendia no chão e era quase difícil respirar diante aquele cheiro horrível que tomava o ar.

Sentiu uma dor em seu braço como se algo a tivesse mordido e quis gritar, mas sua voz não saia. A dor era insuportável.

Os gritos à sua volta aumentava.

Sentiu uma dor em seu braço como se algo a tivesse mordido e quis gritar, mas sua voz não saia. A dor era insuportável.

Zanabia sentiu uma forte pressão na sua cabeça como se algo a fosse esmagar então ouviu uma voz que não vinha do mundo espiritual sussurrar no seu ouvido.

- Nós de alimento...

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Leonardo Ragacini

Biografia

Leonardo Ragacini - tem 26 anos e escreve desde 18 anos. Entre as atividades como documentalista e faculdade procura sempre histórias de todos os tipos na vida real que podem ser tão fantásticas quanto as imaginárias.

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