Conto - Um Pesadelo.



Por volta das dezesseis horas Hanz já estava sozinho em casa, afinal todos tinham seus programas para aquela noite de sábado, menos ele, que decidira tirar um cochilo devido à noite anterior mal dormida.


Após comer alguma coisa decidiu deitar-se. Pretendia dormir algumas horas para conseguir virar a noite na internet, seu programa habitual nos finais de semana.
Mesmo com o vizinho da casa dos fundos ouvindo música num volume relativamente alto não demorou muito para que Hanz adormecesse, não sem antes fazer uma promessa: “Mais tarde ele me paga, deixa só eu ligar o meu aqui.”
Hanz costumava ouvir som alto enquanto o horário permitia, geralmente heavy metal, o que não devia agradar muito a vizinhança acostumada a ouvir pagode, sertanejo, axé e gêneros musicais afins.
Mas aquelas poucas horas de sono lhe reservavam surpresas.
“A rua estava deserta e nem um ruído era ouvido a não ser o das folhas das árvores a balançar com a leve brisa fria que por vezes soprava e arrastava consigo aquelas que, por estarem secas, haviam caído das árvores e agora encontravam-se no chão.
Nem pessoas, nem carros, nem latidos, nada era ouvido naquela noite fria e escura onde a visão alcançava poucos metros devido à forte neblina que dominava o lugar.
Hanz caminhava, braços cruzados para proteger-se do frio, sem saber onde estava e nem para onde ia. Apenas caminhava como que à procura de algo, mas sem saber o quê.
Não usava roupas de frio. Estava de bermuda, camiseta e tênis, uma roupa nada adequada ao frio que castigava seu corpo e que se intensificava ainda mais com o vento gélido que parecia congelar-lhe os ossos.
Esse frio somado a uma indefinível sensação de solidão e abandono o tornavam triste, melancólico... sem forças para prosseguir.
Mas precisava continuar, se ficasse ali não resistiria, tinha que continuar caminhando... tinha que chegar a algum lugar, mesmo sem saber onde...
Procurava ver algum sinal de vida, precisava de ajuda, mas todas as casas estavam escuras e silenciosas como se seus donos as tivessem abandonado. A única luz presente era a dos postes que iluminavam debilmente as ruas vazias onde somente ele caminhava.
Parecia estar numa cidade-fantasma.
Tentou ver as horas, mas seu inseparável relógio não estava em seu pulso, ficou surpreso pois jamais o tirava do braço, nem mesmo para o banho, e isso fez com que ficasse ainda mais confuso.
Por vezes sentia-se observado, como se alguém o seguisse, mas olhando ao seu redor nada via, apenas a capa de neblina que tudo escondia.
Continuou caminhando naquela noite sem lua, onde tudo parecia vazio e morto, onde tudo era silêncio.
Caminhou por ruas, avenidas e praças, passou por igrejas, restaurantes e farmácias, mas tudo estava fechado e sem luzes, sem letreiros luminosos, sem vida.
Teria o fim do mundo chegado e não o tivessem avisado disso?
Perguntava-se sobre o que teria acontecido para as coisas estarem daquele jeito e deu-se conta de que caminhava sem destino, sem saber para onde ir, apenas caminhava pois pretendia encontrar alguém que pudesse explicar-lhe sobre o que havia ocorrido. Cada vez mais parecia que essa busca era inútil pois nada vivo parecia estar mais por ali.
Ainda assim, na esperança de encontrar alguma coisa que explicasse tudo aquilo e também por não ter outra alternativa, prosseguiu em sua caminhada...
Parou em frente a uma doceria, colocou seu rosto contra o vidro e percebeu que ela estava repleta de tortas e doces. Sentiu fome. Foi até a porta e virou a maçaneta, mas estava trancada.
“Que diabos, se está tudo mesmo deserto quem vai se importar se eu arrebentar a vidraça?” – com esse pensamento pôs-se a procurar alguma coisa para executar seu plano, mas não havia nada pelo chão. Olhou para uma árvore e arrancou-lhe um galho.
Aproximando-se da vidraça, antes de desferir o primeiro golpe ainda pensou “Hoje eu me acabo!!”. Mas foi em vão, a vidraça continuou intacta.
Deu então vários golpes, mas nenhum efeito surtiu.
“Mas que inferno, será que isso é blindado?” – pensou já caminhando para a porta que também era de vidro. Atingiu-a várias vezes, mas assim como a vidraça, ela também estava intacta.
- Maldito lugar!!!! – gritou ele jogando o galho longe, que desapareceu na neblina.

Prosseguiu em sua caminhada, sem saber para onde, apenas caminhando.
De repente, enquanto estava absorto em pensamentos tristes, algo lhe chamou a atenção: ouvia vozes ao longe. Não conseguia entender o que diziam, mas parecia ser uma discussão.

Decidiu descobrir do que se tratava e seguiu então para a direção de onde elas vinham. Passos mais acelerados, o vento frio mesmo assim ainda o castigava, seu corpo parecia ser incapaz de aquecer-se. Precisava encontrar um abrigo e talvez os donos daquelas vozes pudessem arrumar-lhe algum antes que congelasse.
Caminhou por umas quatro quadras e o vento parecia enganá-lo pois mudava a direção das vozes fazendo-o caminhar em círculos. Novamente sentiu-se seguido, nada conseguiu ver na neblina densa e dessa vez, sem motivo algum, um temor indescritível apossou-se de seu coração fazendo com que saísse correndo a procura daquelas vozes que certamente lhe trariam mais segurança.
Cessou sua correria ao defrontar-se com um enorme muro feito de rochas, alto e sombrio, como se fosse o muro de um castelo antigo. Diversas árvores de aparência milenar estavam plantadas na calçada o que aumentava o aspecto sombrio do lugar. Ainda ouvia as vozes e seguiu adiante, caminhando mais cautelosamente e acompanhando o grande muro.
Entre a densa neblina conseguiu ver um enorme portão entreaberto logo adiante e as vozes pareciam vir detrás dele. Olhou ao seu redor e apertou mais o passo. Ao alcançá-lo pôde perceber que se tratava realmente de uma discussão entre várias pessoas que aparentemente estavam no interior de uma enorme casa antiga. Instalada ao centro de um imenso quintal a casa era cercada de incontáveis árvores e mato alto, tudo envolvido pela intensa escuridão do lugar.
A neblina não adentrava pelo pesado portão, permanecia pela rua apenas, o que era bastante estranho.
As vozes pareciam tornar-se cada vez mais exaltadas no interior da casa.
Decidiu entrar pois mesmo sem a neblina o vento frio ainda era constante e o castigava e naquela casa encontraria abrigo, além dos donos daquelas vozes.
O portão estava entreaberto e Hanz empurrou-o apenas o suficiente que lhe permitisse entrar para o quintal.
Caminhou para a porta aberta que revelava uma tênue iluminação no interior da casa, possivelmente feita por velas, era a entrada principal e mesmo ouvindo a discussão não percebia nenhum sinal de movimento.
Finalmente encontrara um lugar onde parecia haver vida, ao menos a luz e as vozes indicavam isso.
Lentamente adentrou na casa, silencioso, evitando chamar a atenção das pessoas que estavam ali pois temia alguma coisa, não sabia o quê, mas um medo enorme se apossava dele...
Tudo estava vazio e tanto a tênue luminosidade quanto as vozes vinham de outro cômodo à sua frente.
Um pouco hesitante Hanz decidiu ir até lá verificar de quem eram aquelas vozes. Precisava de ajuda, de esclarecimentos, mas o tom raivoso das vozes e o fato de ser um invasor naquela casa faziam-no se sentir pouco confortável.
Ao adentrar pela sala presenciou uma cena que o deixou desconcertado: todos seus companheiros do grupo*: Renzo, Jean, Tatiana, Paulo e Cibele encontravam-se ali. Maltrapilhos e sujos, discutindo ferozmente como se a qualquer momento fossem capazes de matar uns aos outros.
Pareciam mendigos e estavam machucados e maltratados como que vindos de uma masmorra. Um ódio indescritível emanava de seus olhos.
Percebeu que uma provável carnificina não se dava devido às correntes que os prendiam pelos pés às respectivas cadeiras, impedindo-os de alcançarem uns aos outros.
Atônito, percebeu que nenhum deles notara sua presença, mesmo estando de frente para eles, sentados, presos... Era como se Hanz fosse invisível.
Forçou os ouvidos na tentativa de entender sobre o que discutiam e percebeu que nada mais era proferido além de insultos e palavrões terríveis, nada capaz de dar-lhe pistas sobre o motivo daquela fúria ou daquela situação.
Na enorme sala não havia nenhum móvel, apenas candelabros que traziam as velas e as cadeiras nas quais seus amigos encontravam-se sentados.
- Meu Deus, o que há com vocês? – gritou o rapaz não suportando mais o tormento que aquela situação lhe impunha. Mas ninguém lhe deu atenção, como se ele não estivesse ali, como se nada tivesse dito, como se não existisse.
Olhou ao redor e deu-se conta de que as velas estavam fora do alcance permitido pelas correntes. Quem as havia acendido? Quem havia acorrentado seus amigos? Certamente havia pelo menos mais uma pessoa naquela casa...
Deveria se aproximar e libertá-los? Seu primeiro impulso foi de fazer isso, mas temia aproximar-se pois os amigos pareciam estar fora de si. Pareciam possuídos por alguma entidade maligna tamanho era o ódio que eles emanavam através de seus olhos e de suas palavras. Arremessavam-se uns contra os outros, mas as correntes curtas impediam que alcançassem uns aos outros.
Enquanto raciocinava a procura de uma resposta pôde ouvir uma insistente buzina de moto que vinha do portão por onde entrara. Havia mais alguém.
Correu para fora e avistou o portão que estranhamente estava fechado já que o deixara entreaberto quando entrara. Rapidamente correu até ele.
Após abri-lo com certa dificuldade devido ao seu peso deparou-se com um rapaz alto e magro que chegara numa enorme moto negra como tal qual as roupas que trajava. Estava sem capacete mas usava uma touca que lhe escondia o rosto.
Ao tentar perguntar-lhe alguma coisa o rapaz adiantou-se e entregou-lhe uma caixa de pizza bastante quente. O aroma invadiu-lhe as narinas e Hanz percebeu seu estômago clamando por comida. Novamente sentiu fome.
Mas quem havia feito aquele pedido?
Deu-se conta de que deveria pagar pela pizza, mas onde estava sua carteira? Passou a mão pelos bolsos da bermuda e não a encontrou, e agora o que faria?
Pensou em devolver a encomenda mas o anônimo motoqueiro arrancou com a moto e partiu sem fazer a cobrança, sumindo pela neblina que parecia ainda mais intensa do que antes. Por que ela não invadia o quintal?
Aquilo tudo causava-lhe muita confusão, era uma série de acontecimentos e fatos sem sentido algum, o que estaria acontecendo?
Hanz observou que havia um bilhete grampeado à tampa da embalagem.



"VOCÊ E OS DEMAIS NECESSITAM DE BEM MAIS QUE ISSO. DÊ-LHES DE COMER, MAS DÊ-LHES TAMBÉM UM MOTIVO PARA TEREM ESPERANÇA. MOSTRE PARA ELES A VERDADE. "


Tentou compreender o significado daquele bilhete, mas o motoqueiro já havia partido, para quem perguntaria? Refletiu sobre aquela mensagem, tentou digerir as palavras e encontrar naquela frase a resposta para tudo aquilo.

Um forte vento arrebatou-o como que desejando congelá-lo, apenas sua mão estava aquecida com o calor da embalagem.
Mais uma vez teve a sensação de que alguém o espreitava, o medo novamente fez-se presente e Hanz decidiu voltar para o interior da casa.
No breve trajeto até a porta imaginou como daria de comer à seus amigos que estavam tomados pela ira e que pareciam não notar sua presença. Essa pergunta teria sua resposta assim que o rapaz adentrasse a sala.
O cheiro de sangue era insuportável. Partes humanas e órgãos estavam espalhados pelo chão e pelas paredes da grande sala vazia. As paredes vertiam sangue.
As cadeiras estavam vazias e indicavam que os restos espalhados pertenciam à seus amigos. Era como se eles tivessem explodido devido ao estado em que seus corpos se encontravam.
Seu primeiro sentimento foi o de asco. Um nojo gigantesco que fez seu estômago revirar-se, mas o aroma vindo da embalagem se sobrepôs ao do sangue que impregnava o local. Novamente sentiu fome, mesmo diante da bizarra cena defronte à seus olhos.
Pensou nos amigos por um breve instante, sentiu seus olhos encherem-se de lágrimas, mas a fome fez com que sua atenção se voltasse à embalagem que carregava. Logo ele não mais se recordava dos amigos e não dava importância à carnificina que presenciava, apenas satisfazia seu apetite com o alimento.
Mesmo diante do frio Hanz voltou para o gélido quintal enquanto se deliciava com a pizza. Voltou à sua caminhada na companhia da caixa de pizza que inexplicavelmente não esfriara nenhum grau sequer.
Percorria o escuro quintal com o mato alto na altura dos joelhos e o vento frio percorrendo-lhe o corpo, mas nada disso o incomodava no momento, seu pensamento estava totalmente voltado à pizza. Precisava encontrar um local mais tranqüilo onde pudesse satisfazer definitivamente a fome. Talvez com o estômago saciado sua mente raciocinasse melhor.
Percebeu um sutil movimento em meio ao mato próximo dali, na direção oposta à casa. Ficou estático, quem poderia ser? Talvez a mesma pessoa que aprisionara seus amigos...
“Maldito, a morte deles será vingada.” – pensou aguardando que a pessoa surgisse da escuridão e jogando a fatia que trazia na mão.
Apenas o som do mato e das árvores agitadas pelo vento frio era ouvido, nenhum outro som, nenhum outro movimento...
Seria atacado? Seria ajudado? Teria suas milhares de dúvidas sanadas? Seria atraiçoado? Por que deixara de se aproximar?
Seu coração estava disparado e seu corpo tremia de frio e de medo.
Um leve rosnado fez-se ouvir na mesma direção do mato que se agitara e o medo cresceu. O que seria aquilo? Hanz ficou imóvel acreditando que daquela forma não seria encontrado.
O rosnado ficou mais alto e parecia o rosnado de um cão.
- Brutus**... e aí meninão, sentiu o cheiro da pizza é? – falou amistosamente o rapaz, acreditando tratara-se do seu companheiro canino visto que o som que emitia assemelhava-se ao dele.
Mas o que surgiu das sombras fez Hanz perceber o quanto sua brincadeira fora inapropriada...
Um enorme cão negro, peludo e com o dobro do seu tamanho apresentou-se diante dele. Boca arreganhada, dentes à mostra, olhos furiosos e vermelhos como o de um demônio... Hanz estava face à face com a morte.
Desesperado ele atirou a embalagem que carregava na direção daquela criatura. Ela prontamente avançou sobre a caixa em busca do seu conteúdo o que deu tempo de Hanz disparar em direção ao portão de saída.
À medida que corria, Hanz novamente percebeu murmúrios vindos do lado de fora do enorme muro. Gemidos, lamentos, vozes bem diferentes das que ouvira à pouco e descobrira pertencer aos seus amigos. O medo das vozes fez com que se esquecesse da criatura negra e fez com que pensasse em retornar para o interior da casa.
Eram lamentos semelhantes aos de doentes terminais, aos de vítimas de desastres. Lamentos de dor, de agonia e de desespero.
- Se eu voltar com certeza aquilo vai me pegar. – murmurou ele abandonando essa idéia e voltando a correr na direção do enorme e pesado portão.
Logo estava agarrado à ele, fechado, mas não sabia que decisão tomar. Os lamentos e gemidos vindos do outro lado causavam-lhe um imenso e injustificável pavor, de forma que não se arriscava à abri-lo.
Não tinha coragem de voltar para a casa pois não desejava encarar quem quer que tivesse subjugado e matado seus amigos, pois se havia conseguido subjugar Renzo***, o que seria dele? Mas também não podia permanecer ali parado pois muito em breve a criatura negra viria em seu encalço.
Fortes pancadas passaram a ser dadas no portão, os donos dos lamentos (fossem eles que fossem) pareciam querer entrar a todo custo.
Realmente abrir o portão não parecia uma opção correta. Hanz tinha que escolher outra alternativa, e rápido.
Instintivamente ele saiu em desatada correria rente ao enorme muro, embrenhando-se pelo mato alto e a escuridão. Mesmo com o intenso frio ele começava a transpirar, talvez nem tanto pelo esforço, mas sim pelo nervosismo e isso lhe causava uma sensação incômoda. O corpo quente sendo arrebatado pelo forte vento frio que vinha ao seu encontro. Sentiu-se mal e seu estômago começou a revirar.
Ainda assim ele corria a ponto de suas pernas cortadas pelo capim quase não o acompanharem. Corria mais e mais mesmo com o cansaço e o frio pois esperava que daquela forma a criatura peluda não o encontrasse.
Não enxergava um palmo diante do nariz, a escuridão era total, as tênues luzes da rua não adentravam o quintal por causa do gigantesco muro que ele acompanhava e a casa onde encontrara seus amigos a muito havia ficado para trás. Nada via, somente ouvia. Ouvia o som do capim pisado, o som da sua respiração ofegante, do vento soprando e daqueles lamentos atormentados cada vez mais distantes.
“Até onde vai o terreno dessa casa?” – pensou preocupado com a perspectiva de não ter para onde fugir
Foi quando Hanz foi então lançado ao chão. Havia batido com o ombro em alguma coisa...
Estava correndo muito, a pancada havia sido forte, seu ombro doía bastante...
Pensou em ficar ali deitado e desistir de tudo, pareceu perder a consciência por um breve momento. O suor molhando-lhe o cabelo e as roupas, seu estômago revirando... Não, ele não iria desistir.
Ainda caído r praguejando contra o frio e a sorte, passou a tatear o muro a procura do objeto com o qual teria batido e percebeu algo semelhante a uma escada que subia rente ao muro. Levantou-se e constatou que ela era uma boa alternativa para sua fuga. Não sabia para onde ela o levaria, mas qualquer lugar era melhor do que aquele matagal escuro.
Ouviu o capim mexer-se próximo dali. Alguma coisa aproximava-se velozmente e Hanz não aguardou nem mais um segundo sequer para descobrir de quem ou do que se tratava, apavorado, lançou-se para a escada rezando para não ser seguido.
Subiu por ela velozmente. A escada era longa e o muro alto. E se já não bastasse a escuridão ela era escorregadia e não possuía corrimão assemelhando-se à de castelos medievais. Isso fez com que tivesse mais cautela pois se caísse ou escorregasse tal erro poderia custar-lhe a vida.
Não conseguia avistar o topo da escadaria e nem o final do grande muro, mas à medida que subia os lamentos vindos do outro lado ficavam mais audíveis de forma que o topo devia estar próximo.
Ainda mais ofegante, confuso e apavorado, Hanz finalmente alcançou o topo daquela muralha e de lá podia debilmente ver a multidão que se aglomerava pelo lado de fora. Suas pernas pareciam ser incapazes de sustentar seu corpo tamanho era o cansaço que sentia.
- Mas que diabo tá acontecendo? – murmurou incrédulo ao ver aquela multidão.
A forte neblina e a fraca luz dos postes dificultava a visão, mas ainda assim era possível perceber a aparência bizarra dos componentes daquela multidão que parecia raivosa e prestes a invadir o quintal escuro.
Hanz olhava aquilo perplexo. Não tinha a menor idéia do que significava aquilo tudo, não sabia o que fazer, não sabia como tinha chegado àquela cidade fantasma, não tinha idéia de como seus amigos tinham se metido naquela situação, desconhecia a identidade de quem os aprisionara e matara, não sabia o que era aquilo que encontrara no matagal, estava perdido...
De onde estava não havia para onde ir e o pavor começou a crescer mais e mais quando veio-lhe a idéia de que alguma criatura sinistra poderia subir pela escadaria atrás dele. Para onde fugiria? Não havia para onde fugir.
- Meu Deus, o que eu faço? – gritou desesperadamente.
Sentiu então uma forte pancada em sua nuca. Mesmo com a vista escurecida Hanz não perdeu a consciência e pôde sentir seu corpo caindo no vazio escuro e frio...
Caia para seu fim. Encontraria finalmente a morte e a criatura de olhar demoníaco de banquetearia com seu corpo inerte...
Percebeu que algo o agarrara pelo braço evitando assim que a queda se prolongasse. Ficou pendurado. Forçou a visão que aos poucos retornava e ao olhar para cima na tentativa de identificar quem o havia salvado ficou surpreso ao ver seu pai.
- Meu filho, entenda que muitas vezes aquilo que estamos dispostos a oferecer nem sempre é o que as pessoas estão preparadas ou dispostas a receber. Reflita muito meu estimado Hanz. Vale a pena semear sementes sadias num solo infértil? – sua voz era tranqüila, não condizendo com aquela situação.
Ao ouvir essas palavras o rapaz percebeu que seu pai soltara seu braço e novamente ele era lançado ao abismo escuro e frio.”
Com um solavanco enorme Hanz despertou daquele mórbido pesadelo.
Percebeu os latidos de Brutus no quintal, o que provavelmente o acordara.
Estava suado e sedento como se toda aquela loucura tivesse sido real...
Sentiu o sabor da pizza em sua boca...




Nota: Trecho do livro “Hanz” de Oscar Mendes Filho.


* Hanz e seus amigos fazem parte de um grupo terrorista.

**Brutus é um cão da raça Rotweiller que Hanz tem como animal de estimação.
***Renzo é lutador profissional.



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